domingo, 26 de fevereiro de 2017

Lá, como cá.

Lá, como cá.

              "Há muitos anos que a politica em Portugal apresenta este singular estado:
                        Doze ou  quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o Poder, perdem o Poder. reconquistam o Poder, trocam o Poder.... O Poder não sai duns certos grupos. como uma péia que quatro crianças, aos quatro cantos de uma sala, atiram umas ás outras, pelo ar, num rumor de risos.
                         Quando quatro ou cinco daqueles homens estão no Poder, esses homens são, segundo a opinião, e os dizeres de todos os outros que lá não estão - os corruptos, os esbanjadores da Fazenda, a ruína do País!
                          Os outros que não estão no Poder, são segundo a sua própria opinião e os seus jornais - os verdadeiros liberais, os salvadores da causa pública, os amigos do povo, e os interesses do País.
                           Mas, coisa notável! - os cinco que estão no poder fazem tudo o que podem para continuar a ser os esbanjadores da Fazenda e a ruína do País, durante o maior tempo possível! E os que não estão no Poder movem-se, conspiram, cansam-se, para deixar de ser o mais depressa que puderem - os verdadeiros liberais, e os interesses do País!
                            Até que enfim caem os cinco do Poder, e os outros, os verdadeiros liberais, entram triunfantemente na designação herdada de esbanjadores da Fazenda e ruína do País; em tanto que os caíram do Poder se resignam, cheios de fel e de tédio - a vir a ser os verdadeiros liberais e os interesses do Pais.
                             Ora como todos os ministros são tirados deste grupo de doze ou quinze indivíduos, não há nenhum deles que não tenha por seu turno esbanjador da Fazenda e ruína do País....
                              Não há nenhum que não tenha sido demitido, ou obrigado a pedir demissão, pelas acusações mais hostis.....
                                Não há nenhum que tenha tenha sido julgado incapaz de dirigir as coisas públicas - pela imprensa, pela palavra dos oradores, pelas incriminações da opinião, pela afirmativa constitucional do poder moderador.....
                                 E todavia serão estes doze ou quinze indivíduos os que continuarão dirigindo o País, neste caminho em que ele vai, feliz, abundante, rico, forte, coroado de rosas, e num chouto tão triunfante!"
José Maria Eça de Queiroz - Junho 1871.  

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

O tempo passa e a vida continua.
Aproxima-te um pouco de nós, e vê.
o Pais perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos e os caracteres corrompidos. A prática da vida tem por única direção a conveniência. Não há principio que não seja desmentido, nem instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não existe nenhuma solidariedade dos homens públicos. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos vão abandonados a uma rotina dormente. O desprezo pelas ideias aumenta em cada dia. Vivemos todos ao acaso. perfeita, absoluta indiferença de cima a baixo! Todo o viver espiritual, intelectual, parado. O tédio invadiu as almas. a mocidade arrasta-se, envelhecida, das mesas das secretarias para as mesas dos cafés. A ruína econômica cresce, cresce, cresce.... O comércio definha. A indústria enfraquece. O salário diminui. O Estado é considerado na sua ação fiscal como um ladrão e tratado como inimigo.
Neste salve-se que puder a burguesia proprietária de casa explora o aluguel. A agiotagem explora o juros.
De resto a ignorância pesa sobre o povo como um nevoeiro. O número das escolas só por si é dramático. O professor tornou-se um empregado de eleições. A população dos campos, arruinada, vivendo em casebres ignóbeis, sustentando-se de sardinha e de ervas, trabalhando só para o imposto por meio de uma agricultura decadente, leva uma vida de misérias, entrecortada de penhoras. A intriga politica alastra-se por sobre a sonolência enfastiada do pais. Apenas a devoção perturba o silêncio da opinião, com o padre -nosso maquinais.
(José Maria Eça de Queiroz)

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

AS MULTIDÕES.

"As multidões têm duas vozes, um para o ódio, outra para o júbilo. É um grande mistério o fato de tantas gargantas urrando juntas poderem produzir dois rumores tão diferente".

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

O FALSÁRIO.

Acredita-se sempre, quando se inicia o caminho da mentira, que o trajeto será curto e fácil. Cruzam-se sem dificuldade, e mesmo com certo prazer, os primeiros obstáculos, mas depressa a floresta se faz espessa, o caminho se apaga e ramifica-se  em vários atalhos que se vão perder nos pântanos. Cada passo é entravado, afunda, ou é sugado pela areia movediça. Fica-se irritado, vem o cansaço dos movimentos (tem que usar bengalas) inúteis, cada um deles constituindo nova imprudência.
(Maurice Druon)
"É pelo pecado que se entra mais facilmente em nossa casa. A final a mão que obedece não é pior do que a cabeça que ordena".

sábado, 12 de novembro de 2016


"Estremecemos ao pensar no que é preciso de buscas para chegar á verdade sôbre o mais fútil pormenor".
(Stendhal)